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resenha critica do filme casa grande menino 15 linhas por favor ​

Sagot :

Resposta:O filme “Casa Grande” evoca uma alegoria

capaz de dialogar diretamente com a Geografia:

a dimensão espacial e multiescalar da profunda

segregação da nossa sociedade em termos

econômicos, políticos, étnicos e de gênero. “Casa

Grande” (e “Senzala”) são arranjos espaciais que

remontam ao período do Brasil-Colônia, embora

tenham adquirido maior notoriedade através da

obra homônima de Gilberto Freyre, lançada em

dezembro de 1933. O diretor e roteirista Fellipe

Barbosa propõe, através do filme, uma reflexão

crítica (e, muitas vezes, até demasiadamente

didática) das práticas sociais das famílias

notadamente (mas não exclusivamente) da elite

brasileira. O exercício proposto por Fellipe vai

além do microespaço do cotidiano familiar. A partir

dele, o espectador é convidado a perceber como

a alegoria da “Casa Grande e Senzala” é ainda

muito viva na própria forma e conteúdo da maioria

das cidades brasileiras, onde os componentes

étnicos e de gênero da segregação socioespacial

encontram também questões fundamentalmente

de cunho econômico. O cotidiano de uma família

decadente da elite carioca é assim tomado

enquanto fio condutor da narrativa, que possui

como outro componente importante da trama as

contradições da cidade do Rio de Janeiro.

   O filme chega aos olhos do espectador

através da ótica do adolescente Jean (Thales

Cavalcanti), um jovem branco de uma família

rica carioca que vive os dilemas de uma vida

confortável em seu seio familiar. Em seu cotidiano,

Jean mora numa mansão junto com o pai Hugo

(Marcello Novaes), a mãe Sônia (Suzana Pires)

e a irmã Nathalie (Alice Melo). A dinâmica familiar

da “Casa Grande” remonta a todo momento

às alegorias freyrianas usadas para explicar a

formação social brasileira há mais de oitenta anos.

A família é dominada pelo patriarca Hugo, um

homem de negócios que tenta a qualquer custo

manter as aparências da família num cenário de

crise das suas finanças. Sônia faz o papel de “boa

esposa”: cuida dos filhos, é obediente ao marido e

ainda “complementa” a renda familiar em tempos

de crise lecionando aulas particulares de francês

– língua em franca decadência no mundo e que

no enredo fílmico é quase um sintoma da própria

decadência aristocrática da família. Os filhos –

Jean e Nathalie – seguem suas vidas centradas

na rotina dos estudos, sendo que Nathalie

praticamente não tem direito a voz no filme. Ela

acaba, muitas vezes, silenciada pelo próprio

pai e irmão, numa clara alusão às estruturas

familiares patriarcais brasileiras. O irônico é que

ela talvez seja a pessoa que consiga ter a maior

sensibilidade e perspicácia diante dos problemas

que a família atravessa, apesar do silenciamento.

   Um ponto notável do filme é que a dimensão espacial da segregação é quase

uma personagem ao longo da narrativa. No

núcleo familiar da “Casa Grande”, ela ganha

formas explícitas na relação estabelecida entre

a família de Jean e os seus empregados. Cada

classe possui territórios bastante definidos na

casa: os empregados transitam pelos espaços

predominantemente do trabalho como a cozinha

e a área de serviço, enquanto aos patrões são

destinados notadamente os espaços do lazer, das

refeições, do descanso e da leitura. Só que tal

divisão não é construída por um viés maniqueísta

através da guerra moral entre o “bem” e o “mal”;

na verdade, os personagens dentro da “Casa

Grande” convidam o espectador a refletir sobre

a complexidade das relações entre diferentes

classes sociais em nosso país, quando muitas

vezes desigualdades políticas e econômicas

caminham lado a lado à outras formas de

opressão como questões étnicas e de gênero. O

perfil predominantemente negro dos empregados,

sua origem pobre, a presença de mulheres como

gênero responsável pelas rotinas domésticas,

ou ainda o fato de parte deles serem imigrantes

nordestinos balizam o desenvolvimento de

relações conflituosas de afeto entre patrões e

empregados – em especial quando cada um deles

transita pelo território hostil do “outro”.

   Mas o papel da segregação não se limita

à escala do espaço familiar. Como apontado

anteriormente, a narrativa se encontra com as

contradições do urbano através das aventuras de

Jean pelo Rio de Janeiro. Depois da demissão do

motorista particular da família, ele é obrigado a

ir à sua escola (o Colégio São Bento, tradicional

inúmeros problemas.